Biografia: Benedita Da Silva

Anderson Menezes
4 min readJul 11, 2024

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Benedita Sousa da Silva Sampaio (Rio de Janeiro, 1942). Parlamentar, deputada constituinte, gestora, liderança comunitária, feminista negra. A biografia de Benedita da Silva se confunde com a experiência democrática do Brasil desde o fim da ditadura civil-militar (1964-1985).

Filha de Maria da Conceição de Souza e de José Tobias de Souza, moradores da Zona da Mata Mineira, os pais de Benedita trabalham como lavradores em condições análogas à da escravidão. Em 1936, a mãe de Benedita migra para o Rio de Janeiro e retorna a Minas Gerais em 1938 para buscar a família. Na capital fluminense, seu pai exerce a profissão de pedreiro e de lavador de carro e sua mãe, de lavadeira, além de ser parteira e manter um terreiro de umbanda. Recém-nascida, Benedita muda-se com a família para a favela Chapéu-Mangueira, no bairro carioca do Leme.

Em situação de extrema pobreza, todos os filhos trabalham desde a infância. Aos sete anos, Benedita vende balas e engraxa sapatos. Sua formação escolar é bastante prejudicada pelas condições econômicas: concluiu apenas o ensino primário e interrompe os estudos para trabalhar.

Na infância, é violentada por um amigo da família. Sem coragem de contar o estupro para a mãe, convive por anos com o trauma da violência sexual. Na adolescência, experiencia a discriminação racial: chamada de “negra maluca”, sofre agressões físicas com puxões em seu cabelo e vive toda sorte de insulto racial.

Casa-se aos 16 anos. Nessa época, trabalha como empregada doméstica e seu marido, o Mansinho, como pintor de paredes. Benedita perde dois filhos prematuros e os outros dois começam a trabalhar bem cedo: a primeira, com serviços domésticos, e o segundo, com entrega de pães.

Adulta e mãe de família, Benedita conquista o diploma de segundo grau no exame de Madureza, curso de educação para jovens e adultos. Em 1968, converte-se ao protestantismo na Igreja Assembleia de Deus. Em 1975, torna-se servidora pública no Departamento de Trânsito (Detran) do Rio de Janeiro. Anos depois, frequenta um curso de auxiliar de enfermagem e passa a trabalhar no Hospital Municipal Miguel Couto.

Com atuação política na comunidade durante as décadas de 1960 e 1970, torna-se líder comunitária e funda o Departamento Feminino da Associação de Moradores do Chapéu-Mangueira. Em 1982, disputa as eleições para vereador do Rio de Janeiro pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Sua campanha é marcada pela articulação das pautas identitárias de gênero (mulher), raça (negra) e território (favelada). Eleita, conta com assessoria da intelectual e colega de partido Lélia Gonzalez (1935-1994). Nessa época, com expressiva atuação nos movimentos de mulheres negras e de favelas, realiza o primeiro encontro de mulheres de favela e de periferia. Ao lado de Lélia, Benedita é uma das integrantes do Conselho Nacional da Mulher (1985-1989). Em 1985, ambas representam as mulheres negras brasileiras na Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nairóbi, no Quênia.

Em 1986, elege-se deputada constituinte e, ao lado de Paulo Paim, Edmilson Valentim e Carlos Alberto “Caó”, assume na Assembleia Constituinte a representação dos movimentos sociais em busca de afirmação dos direitos para as populações negras e quilombolas do país.

Em 1988, atua com lideranças negras na Marcha contra a Falsa Abolição. No mesmo ano, organiza com o movimento social negro o I Encontro de Mulheres Negras do Brasil, em Valença, Rio de Janeiro.

Em 1991, propõe na Câmara dos Deputados a instituição da primeira Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o extermínio de crianças e adolescentes no Brasil, oficializada na Resolução de nº 14. Em 1994, é eleita senadora da República. No pleito de 1998, torna-se vice-governadora do Rio de Janeiro e ocupa o cargo de governadora por aproximadamente nove meses.

Em 1997, publica sua primeira biografia no Brasil e nos Estados Unidos. O livro conta com prefácio do pastor norte-americano Jesse Jackson (1941), liderança do movimento pelos direitos civis, político filiado ao Partido Democrata e fundador e presidente da National Rainbow Coalition.

Durante as primeiras décadas do século XXI, Benedita protagoniza ações fundamentais para ampliar e garantir os direitos de trabalhadores, das mulheres e dos negros no Brasil. Entre elas, destaca-se sua atuação em 2013 na aprovação da Proposta de Emenda à Constituição 66/2012, conhecida como PEC das Domésticas, que estende às empregadas domésticas os direitos trabalhistas assegurados na Constituição. Em 2020, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acata a consulta da deputada federal que reivindica a destinação de parte do Fundo Eleitoral para financiamento de campanhas de candidaturas negras, com objetivo de enfrentar a subrepresentação de negros e negras na política institucional.

Com o currículo marcado por produções legislativas e articulação política em defesa dos direitos de mulheres, populações negras, quilombolas e moradores de periferias e favelas, Benedita da Silva tem seu nome inscrito em diferentes momentos da política brasileira, desde o fim da ditadura civil-militar. Conhecida internacionalmente por sua luta pelos direitos humanos, possui trajetória singular e de longa duração na representação política do país.

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Anderson Menezes

Niteroense, Taurino e Botafoguense. "Be nice, be Human" Ubuntu!